sábado, 25 de abril de 2020

A vida é frágil, mas há resistência e luta: Viva a Revolução dos Cravos!





        Sim. A vida é frágil. É o que percebemos no decorrer desta pandemia, assim como, por exemplo, numa UTI neonatal, como a da foto que faz parte da exposição “O Tempo das Mulheres”.


Fotografia de Alfredo Cunha

 Essa foto me tocou em particular, porque estive, durante quase três meses – foi em 2002 -, visitando diariamente, fizesse sol ou chuva ou vendaval, uma UTI neonatal. O motivo de tais visitas: minha filha Andreia nasceu prematura de seis meses e graças a tod@s @s profissionais que trabalhavam naquela UTI, a do Hospital São Vicente de Paulo, na Tijuca, Rio de Janeiro-RJ,  ela, a Andreia, está hoje aqui, tem 17 anos e muitos sonhos,  apesar de o Brasil não nos dar muitas razões para sonharmos e acreditarmos num futuro melhor, em que tod@s tenham acesso a serviços de saúde de qualidade, só para citar um daqueles que deveriam ser direitos fundamentais e inalienáveis dos seres humanos.
Nestes tempos de pandemia de COVID-19, vemos e sentimos efeitos de políticas de implementação de teto de gastos e de congelamento de investimentos em saúde e em educação. Não há testes suficientes; não há respiradores suficientes; não há leitos em UTIs suficientes para atender a tod@s.
         Por outro lado, vemos e sentimos a importância das universidades, dos institutos, dos centros de pesquisa, dos hospitais, a grande maioria públicos, para o socorro à população e à descoberta de uma vacina que nos livre desse novo coronavírus.
         Em um país de dimensões continentais como o Brasil - nem em qualquer outro -, não podemos continuar vivendo como se a maior parte da população estivesse perpetuamente condenada à exclusão. É preciso urgentemente trabalharmos na construção de um mundo justo, verdadeiramente democrático. Como disse o Papa Francisco “era ilusão pensar “que continuaríamos sempre saudáveis num mundo doente”. [1] 
       Hoje, eu escrevo, inclusive, para espantar a morte para bem longe daqui e para bem longe de tod@s nós, como a contadora de histórias das Mil e uma noites fazia para continuar viva há muitos e muitos anos e continua e continuará a fazê-lo para quem lê e ler suas histórias.
       No Brasil, estamos vivenciando uma espécie de filme de terror ao vivo e a cores com consequências nefastas para o presente e o futuro da maior parte de nós. Contudo, a literatura nos ensina que “nada é impossível de mudar”, como dizia Brecht.
Segundo Antonio Candido, em O direito à literatura: “ A produção literária tira as palavras do nada e as dispõe como todo articulado […]”.[2] E por falar em palavras, elas acompanham as fotografias, os vídeos, a disposição das imagens que compõem a exposição “O Tempo das Mulheres”, a que me referi no início deste texto.
Nessa exposição, as salas do Museu de Lisboa, nos arredores da Praça do Comércio, banhada pelo Tejo, não escondem que foram minuciosamente escolhidas para abrigar “O Tempo das Mulheres”. Sim, há interação harmoniosa entre arquitetura, fotografias e palavras escritas, lidas e ouvidas. E o “O Tempo das Mulheres”, que gerou também uma publicação, lançada no dia da inauguração da exposição, é um tempo de inclusão, não ainda total, o que está espelhado nas fotografias que são de autoria de um homem, o fotógrafo Alfredo Cunha, e os textos que foram escritos por uma mulher, a jornalista Maria Antónia Palla, uma das grandes defensoras dos direitos das mulheres, em Portugal, conforme podemos ler no site citado nas notas desta postagem.[3]

Texto de Maria Antónia Palla

Fotografia de
Alfredo Cunha
Praça do Comércio, Lisbo

         Se isso não bastasse, a exposição de que falamos, comemoração dos 50 anos de carreira de Alfredo Cunha, é dividida em etapas ou estações da vida, cada uma delas localizada em compartimentos diferentes: a infância, a juventude, a idade adulta e a velhice, essa última chamada de folhas caídas (numa alusão à obra homônima de Garrett? não sabemos).  Ainda sobre essa etapa, a velhice, ela tem início em uma sala que possui um portal mais estreito do que os das outras salas, talvez, uma referência ao menor número de pessoas que chega a tal fase da vida. E não poderiam faltar recordações da Revolução dos Cravos nas fotografias, no vídeo que passa, ao som de “Grândola Vila Morena“ (terra da fraternidade) e hoje, vejo no calendário, é 25 de abril. 
Lembro-me das palavras de Benjamin: “[…] os calendários não marcam o tempo do mesmo modo que os relógios. Eles são monumentos de uma consciência histórica […]”[4]. Recordo-me, mais uma vez, que nada é impossível de mudar e sinto, um cheirinho de alecrim[5] e a vontade de dar vivas à Revolução de Abril:  (continua)    



O Tejo e, ao fundo, a Ponte 25 de Abril, Lisboa, Portugal



[2] CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 4 ed. São Paulo/Rio de Janeiro: Duas Cidades/Ouro sobre Azul, 2004, p. 177.
[4] Benjamin, Walter. Sobre o conceito da história. In: Benjamin, Walter. Magia e técnica, arte e política: Ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 2012, p. 250.  
[5] Referência à canção de Chico Buarque de Holanda: “Tanto Mar”.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

A vida urge

Volto a publicar no blog Crítica & Arte porque gosto muito de escrever e acho que está mais do que na hora de fazermos aquilo que gostamos de fazer. Essa pandemia desnaturalizou o deixa para depois. A vida adiada para a satisfação de nem sabemos quem: os patrões? Os empresários? Os banqueiros? As contas que chegam todos os meses?
A meu ver, uma escritora escreve para ser lida e apesar de ainda não ter um número grande de leitoras e de leitores, tenho algumas e alguns muito querid@s. Inclusive, uma ex-aluna muito querida, a Katiane, me pediu para continuar a escrever no blog. Enfim, volto a escrever, pois não posso viver de um futuro, como o estampado numa estação de metrô em Lisboa. O que vamos fazer hoje? Não devemos adiar. A vida urge. Então, escrevo e vou falar da viagem que fiz recentemente a Portugal, mas não só sobre isso. Um assunto puxa outro e…
         Bem voltei de uma viagem de pesquisa a Portugal e ainda durante a viagem já estávamos vivendo esta situação provocada pela pandemia de COVID-19. Cheguei a ficar com receio de não conseguir voltar para o Brasil, mas regressei ao Rio no dia 16 de março e esse foi o dia em que dei início à quarentena.
Sobre a viagem, guardo ótimas lembranças dela. Consegui recuperar meu ânimo, ânimo este que me dá forças para viver este isolamento social, pois andava muito triste com os acontecimentos políticos do nosso país, que parece condenado a uma eterna subalternidade, a uma eterna desigualdade pelas chamadas, por Jessé Souza, elites do atraso.
Mas voltemos ao relato sobre a viagem: cheguei a Lisboa e grande parte das árvores daquela capital estava sem folhas. O tempo passou, em torno de 25 dias, e as folhas começaram a nascer, assim como pequenas margaridas nos gramados, detalhes que nos ajudam a perceber a força da vida.




Aqui em nosso país, as estações do ano são mais sutis. Não é verdade que temos apenas duas estações. Não. As quatro existem, mas apenas o verão aparece com mais força. O outono, no Rio, é a estação em que o céu fica mais bonito, límpido, quase sem nuvens. Maio, um dos meses da Comuna de Paris e das Conferências Democráticas do Casino Lisbonense, é um dos mais lindos na cidade em que nasci. Mas falemos sobre a recente viagem que fiz a Portugal.
Fui para pesquisar na Biblioteca Nacional, em Lisboa, mas tive a oportunidade de ir a Coimbra e ao Porto


BN-Lisboa


Nunca havia ido a Coimbra. Estive nos degraus da Sé Nova, onde Eça de Queirós conheceu Antero de Quental. Pude conhecer também a belíssima Biblioteca Joanina. No prédio, havia uma exposição sobre Sophia de Mello Breyner Andresen, poeta que muito admiro. 


Coimbra e o Mondego


Coimbra

Coimbra
Coimbra

Pude também caminhar pelas ruas de Coimbra e procurar, com a ajuda do google maps e indicações de um amigo querido, a casa em que Eça de Queirós morou, quando era estudante. Encontrei a casa e tive a impressão de se eu começasse a chamar por Eça, ele apareceria na janela do número 12 da rua do Loureiro. E diante de toda aquela atmosfera, imaginei a força de uma geração que não se curvou diante do peso de um passado estampado naquelas paisagens e naquelas construções. 


Também percebi a constante recordação da Revolução dos Cravos, ainda hoje, nas ruas, no metro, em exposições, como a excelente o Tempo das Mulheres, fotografias de Alfredo Cunha e textos de Maria António Palla, que tive a oportunidade de visitar, no Museu de Lisboa. Uma exposição que tem início com uma foto de uma bebê prematura em uma incubadora, antecedida pelo título:
                           A infância O SOL DA VIDA
                                           THE LIFEGIVING SUN
                                                            (continua)

Lisboa