terça-feira, 30 de junho de 2020

Nas proximidades da primavera, que, um dia, irá chegar


No dia 26 de junho, tive que enviar um documento pelo correio – não podia deixar de fazê-lo - e fui obrigada a sair do isolamento social.
Até então, estava praticamente recolhida em casa desde que voltei de uma viagem de pesquisa a Portugal, em 16 de março.
Quando saí, naquela sexta-feira, fiquei impressionada com a quantidade de pessoas nas ruas, inclusive, algumas sem máscara, apesar do perigo que é a COVID-19 e pensei: - quem vai responder por tudo isto? Quem será responsabilizado por tantas mortes que podiam e podem ser evitadas se não estivesse ocorrendo um desencontro de informações, além da atitude do governo federal acerca do novo coronavírus (e não só acerca do coronavírus) e a abertura, a meu ver, precoce de shoppings, de serviços não essenciais. Infelizmente, ainda não sabemos. E a água, no Brasil, sendo privatizada no meio de uma pandemia.
Muito triste.
E para fugir um pouco desta tristeza, fui buscar, nas minhas lembranças, a viagem que fiz, no início do ano, a Portugal.
Lembro-me que passei o  8 de março, Dia Internacional das Mulheres, numa Lisboa ainda não recolhida pela pandemia.
A manifestação teve início no Largo de Camões, o mesmo em que se passa a última cena da terceira versão de O Crime do Padre Amaro, de Eça de Queirós - lembram? – e seguiu até São Bento.
No caminho, pessoas nas janelas, muitas delas mulheres, aplaudiam sorrindo.
Cheguei a ver Pilar del Río passar com suas elegância e simplicidade costumeiras.
Nas proximidades de São Bento, havia uma multidão.
Tímida, mas entusiasmada, acompanhei a passeata até lá.
Quando chegamos a São Bento, um menino me ofereceu um pequeno cartaz com palavras de ordem. Sorri e disse a ele que não era dali. Ele sorriu muito amavelmente e me ofereceu de novo o cartaz que peguei agradecida e me senti parte daquilo tudo, ainda mais quando ouvi a língua portuguesa ressoar, em várias sonoridades, inclusive a brasileira, e vi a placa em homenagem à Marielle Franco – presente, agora e sempre! - naquele final de tarde, nas proximidades da primavera, que, um dia, irá chegar…