sábado, 22 de setembro de 2012

Edição de Texto e Crítica Filológica


Edição de Texto e Crítica Filológica, dos professores Rosa Borges, Arivaldo Sacramento Sousa, Eduardo Silva Dantas de Matos e Isabela Santos de Almeida (Salvador: Quarteto, 2012), tem por epígrafe um poema de Odires Fonseca, que começa com os seguintes versos: Quebrar o brinquedo/ é mais divertido. E não é à toa que o poema de Odires Fonseca serve de epígrafe a esse livro, pois há nesses versos uma interessante analogia com o trabalho do filólogo ou crítico textual que estuda textos modernos.

 Explico: a Crítica Textual Moderna trabalha com originais presentes, como diz o Professor Ivo Castro. Ou seja, com textos que muitas vezes são manuscritos autógrafos com rasuras, substituições, registros de hesitações na escolha de palavras ou ainda com etapas de construção ou versões de uma obra que poderão ou não vir a ser conhecidas do grande público.

Trabalhar com manuscritos, com etapas de construção de textos e com versões textuais é como quebrar um brinquedo. O brinquedo, no caso dos estudos de Crítica Textual, é o texto que pode muito bem ser uma determinada obra literária: um romance, um poema, uma peça teatral. E a Crítica Textual é tão ampla que contempla também estudos de produção, transmissão e circulação de textos.

Felizmente, para os leitores, tal amplitude da Crítica Textual pode ser facilmente percebida nas páginas de Edição de Texto e Crítica Filológica, que estão divididas nos seguintes capítulos: Filologia e Edição de Texto, de Rosa Borges e Arivaldo Sacramento de Sousa; Edição Crítica em Perspectiva Genética, de Rosa Borges; Edição Genética, de Eduardo Silva Dantas de Matos; Edição Interpretativa em Meio Digital, de Isabela Santos de Almeida e Edição Sinóptica, de Arivaldo Sacramento de Sousa. Vale lembrar que todos esses capítulos estão divididos em subcapítulos e esse livro, além de dialogar com autores não comumente estudados em Crítica Textual, apresenta bibliografia atualizada e não foge de questões polêmicas e problemáticas como a da conceituação de Filologia e mesmo a da definição de Crítica Textual que não é tão pacífica como as que aparecem sintetizadas em alguns manuais da referida disciplina.

Edição de Texto e Crítica Filológica traz ainda definições, explicações, exemplificações de tipos de edições, alguns deles pouco divulgados no meio editorial de nosso país e em manuais de Crítica Textual, mas cujo conhecimento é importante e mesmo fundamental ao aluno, ao pesquisador, ao professor-pesquisador-extensionista das Faculdades e Institutos de Letras ou de Filosofia, Letras e Ciências Sociais do Brasil e do exterior. Também não se exime de falar sobre Crítica Textual, Tradução, Adaptação (inclusive numa perspectiva genética, como é o caso do estudo sobre a primeira cena da adaptação de Cândido ou O Otimismo, realizada por Cleise Furtado Mendes de um conto do filósofo iluminista Voltaire), sobre edição interpretativa em meio digital (a do Auto da barca do rio das lágrimas de Irati, da dramaturga Jurema Penna), como também sobre a censura que, nos anos 70, cercava, por exemplo, a produção teatral brasileira. E, nesse sentido, recupera também o nome de um dramaturgo, Fernando Melo, e de atores como Mário Gomes e do saudoso Nestor Montemar, que pouco circulam hoje na mídia e que raramente são citados nos cursos de Letras do país. Tal papel, o de fazer novamente circularem nomes, textos, obras, é característico da Crítica Textual que – e o livro de Rosa, Arivaldo, Eduardo e Isabela destaca isso – não está hoje - e já há algum tempo – voltada apenas às origens, mas, principalmente, à historicidade da produção e da transmissão de textos e de textos e de suas versões e modificações autorais e não-autorais que formam a obra que muitas vezes parece, aos olhos dos leitores, surgida já pronta a partir da inspiração de seus autores e autoras. Fala ainda de Crítica Textual e Informática – o Projeto Cervantes é lá citado-, como também de Artur de Salles e seu projeto não inteiramente concretizado do livro Poemas do Mar, que ressurge da correspondência do escritor baiano e seu amigo Durval de Moraes, por meio do trabalho filológico de viés genético.

Da leitura de Edição de Texto e Crítica Filológica fica clara a importância e a necessidade da Crítica Textual para os Estudos Literários.

Sim, concordo com Odires Fonseca: Quebrar o brinquedo/ é mais divertido.

                                                      

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